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01Mar2013

Ela era “coisa boa de comer”

Foto: André Nery

EMBRAPA desenvolve trabalho de pesquisa com o intuito de evitar a extinção da mangaba e outros frutos típicos

Perguntar não ofende, dileto leitor. Você se lembra da última vez que viu - e mais do que isso, comeu - uma mangaba? Ou melhor, sem auxílio das imagens que compõem esta matéria, você seria capaz de identificar uma? Bom, quem ainda encontrar uma praia mais ou menos deserta, em meio ao surto imobiliário à beira-mar, pode vislumbrar uma mangabeira, árvore nativa responsável por dar ao mundo essa frutinha que os indígenas, em tupi, chamavam de “coisa boa de comer”. Caso contrário, terá que incorrer e se dar por satisfeito com o suvenir dela: os picolés e sorvetes industrializados e os sucos da polpa. E com sorte.

É que uma pesquisa da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) chegou à conclusão de que 90% das áreas cobertas pelas mangabeiras em Pernambuco foram dizimadas. No lugar delas, loteamentos imobiliários, viveiros de camarão ou plantações mais rentáveis economicamente. Foi o que constatou Josué Francisco da Silva Junior, pesquisador da entidade e um dos líderes do estudo, depois de oito anos de levantamento de dados. De acordo com ele, 90% das mangabas produzidas no País são de origem extrativista e, com o desmatamento, a demanda tem sido menor do que a oferta.

“Seus pés estão em áreas de alto valor imobiliário; nas restingas, tabuleiros e cerrados, e são árvores nativas. Há poucas áreas de plantio da espécie”, diagnostica o estudioso das relações do fruto com os recursos e políticas extrativistas do Brasil. Em Pernambuco, a situação é a mais grave do Nordeste. Mangabeiras foram trocadas por condomínios de luxo perto do mar e fazendas aquáticas de camarão. “Aqui no Estado, o extrativismo em terrenos de livre acesso só acontece em seis áreas. Em Sergipe, por exemplo, são 24; além de uma associação formada por catadoras para gerir da melhor forma os pés”, contabiliza Josué.

Estamos falando de acessos extrativistas onde os catadores, que fazem girar a roda da demanda pública da fruta in natura, têm livre acesso. Há sim, outras áreas com plantações, mas essas voltadas apenas para atender à indústria da polpa. Vendedor de frutas, na feira do Mercado de São José, há dez anos, Seu Dedé tem orgulho de ser o único a vender o ingrediente por ali. “O preço está muito alto e ninguém quer comprar. Há três anos, a mangaba que chega ao Ceasa [Centro de Abastecimento e Logística de Pernambuco] está vindo do Rio Grande do Norte e de Sergipe. E mesmo assim, pequenas e verdes. As maiores e carnudas seguem para as fábricas de polpa”, detalha. Na barraca de Seu Dedé, o quilo da fruta que, há dois anos, era vendido por R$ 3, atualmente custa R$ 7.

Prazer ameaçado

Mas não é apenas a mangaba que está no rol das frutas ameaçadas. O catálogo mundial “Arca do gosto”, produzido pela entidade Slow Food Brasil, que faz referência nominal direta à Arca de Noé, fez o levantamento dos produtos ameaçados de extinção em território brasileiro com potenciais produtivos e comerciais reais. Na lista, 21 alimentos figuram como ameaçados. Entre os quais, alguns conhecidos nossos, como macaíba, umbu, arroz vermelho e aratu.

Não estão listados nesse estudo, mas a dificuldade de comprar é notada por quem frequenta as feiras e mercados, exemplares de oiti, sapoti, araçá e carambola também estão cada dia mais difíceis. Frutinhas de infância, que propiciaram os doces e sucos que aguçaram nosso paladar e construíram nossa identidade comestível. Nos tabuleiros agora - com bastante recorrência e livre das restrições de safras - lichias, atemóias, mangostins e peras asiáticas.

No caso da mangaba, pelo menos, a Embrapa realiza um projeto de banco ativo de germoplasma que, em outras, palavras, conserva os recursos genéticos da espécie. Em Pernambuco, esse banco está localizado no Litoral Sul (Ipojuca, Tamandaré e Sirinhaém), com um total de 72 pés preservados. Passo importante para a próxima geração saber o que é o visgo de uma mangaba. A frutinha que os índios chamavam de “coisa boa de comer”.

A fruta

Aromática, polpuda e viscosa - ao ponto de deixar a boca de quem a come, quando in natura, colando. A cada 100g, detém apenas 43 calorias, e em sua composição são encontradas as vitaminas A, B1, B2 e C, além de ferro, fósforo, cálcio e proteínas. Hoje, no Brasil, o estado de Sergipe é o maior produtor brasileiro, vindo de lá quase todo o montante. Além das mangabas, as mangabeiras (que podem chegar até sete metros de altura) também propiciam látex - este utilizado na fabricação de uma borracha de cor rosada.

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